Sem sombra de dúvida, a vila de
Trancoso e o seu concelho são antiquíssimos, havendo
quem reporte o primitivo povoamento ao séc. XIX
a.. C. A essa primeira fixação humana não é alheia a existência
de um primitivo castro pastoril, posteriormente defensivo,
provavelmente situado no mesmo local onde mais tarde se
havia de erguer o castelo. Com a chegada dos invasores
romanos, em 301 a. C., o castro foi por estes aproveitado
e ampliado, dada a sua posição estratégica. Notícias
documentadas sobre Trancoso só aparecem no séc. X, e
estas no testamento de uma rica-dona de então, chamada D.
Chamôa (ou D. Flâmula ou D. Chama), filha do Conde D.
Rodrigo, com doação do castelo e dos bens que aqui
detinha, uma vez que estava na posse de toda a região a
sul do Douro.
Antes da ocupação
romana, passaram por Trancoso os cartagineses, os romanos,
depois de vencidos os naturais. É neste período de domínio
de Roma que são efectuadas obras que deixaram marca:
pontes, estradas, fontes, sepulturas, modos de vida e
alguns usos daquela civilização. Em 585 da era cristã
inicia-se o domínio dos Visigodos, que assim mantiveram o
seu poderio durante século e meio, até a região passar
para as mãos de Tarik, de Musa e para Afonso I de Leão.
Em 811 aparece um árabe
de nome Ali-Benir, o qual conquistou a região. Não durou
muito o seu reinado, acabando morto no ano seguinte numa
feroz batalha travada entre cristãos e árabes em Vale de
Mouro. Depois desta conquista, os cristãos chamaram seu o
castelo e o termo dos seus domínios, só lhes sendo
retirado pela força de um outro emir árabe, bem mais
sanguinário, de nome Almançor, corria o ano de 930. Em
939, Ramiro II de Leão
derrotou os mouros e tratou de povoar a zona com os
seus, de que se ocupou uma senhora nobre, chamada Flâmula,
sua sobrinha, a qual tratou de fazer testamento destas e
de outras terras ao Mosteiro de Guimarães. Almançor,
regressou para retomar o que já tinha conquistado, em
985.
Fernando Magno, senhor de Leão e Castela, entrou
em luta com os ocupantes e tomou Trancoso e tudo o que
aqui vivia no ano de 1033. Tal como tinha feito D. Flâmula,
Fernando Magno doou Trancoso ao senhorio de um tal
Sizenando. Deste senhorio
passou, por herança, para D. Garcia, cuja posse durou até
1037, passando sem explicações para o feudo de Afonso VI
de Leão. Fernando Magno mandou repovoar e reparar
a fortaleza, passando esta no ano de 1065 a fazer
parte do reino da Galiza, então governada por D. Garcia.
Trancoso
torna a passar de mãos com a entrega do condado a D.
Henrique, como dote de D. Teresa, em 1097. À morte de D.
Henrique, a sua esposa D. Teresa entregou Trancoso a um
rico-homem, que era cunhado de D. Afonso Henriques, de seu
nome Fernão Mendes, de Bragança.
Os mouros, em 1139,
valendo-se dos exércitos de Albucazan (ou Abul Hassan),
rei de Badajoz, conseguiu pôr cerco à vila, mas viu-se
privado de a tomar. Nesse mesmo ano, após a derrota
sofrida em Ourique, os mouros de Omar puseram cerco a
Trancoso. A este cerco não resistiram os sitiados, nem
resistiram as fortes muralhas, totalmente arrasadas pelos
infiéis. Foi num estado lamentável que D. Afonso
Henriques encontrou Trancoso, quando aqui se deslocou para
a resgatar dos árabes. Depois desta vitória, e como
promessa por ter recebido as graças de vencer os
inimigos, D. Afonso Henriques determinou-se a cumprir o
voto de mandar construir um mosteiro em Tarouca, de invocação
de S. João Baptista. Só a partir desta vitória de
Trancoso é que o grande guerreiro
usou, pela primeira vez, o título de Rei de
Portugal.
Não eram volvidos
vinte anos, saltaram eles da Andaluzia para, de novo,
destruírem a vila e os seus moradores. Encontrava-se o
rei em Beja, de onde arrancou
sobre os invasores, dando-lhes derrota no ano de
1160. Foi então doada
a vila à Ordem dos Templários.
Com
data desconhecida (porventura depois de 1154 e não depois
de 1173), o foral de D. Afonso Henriques a Trancoso, teve
como finalidade o repovoamento. Este foral é o leonês de
Salamanca, servindo de padrão a muitos outros, só se
conhecendo o seu teor por se encontrar na confirmação de
D. Afonso II, ao tempo sem referir a data do primeiro.
Em
Outubro de 1217, D. Afonso II confirmou este foral, com
muitos e novos privilégios para os moradores, o mesmo
fazendo D. João
I, por carta dada em Évora no dia 12 de Janeiro de 1391.
Esta é a saga heróica da vila e concelho de
Trancoso que hoje engloba no seu alfoz dois dos extintos
concelhos medievais: Guilheiro e Moreira de Rei.
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