A RAZÃO PELA QUAL DOM AFONSO HENRIQUES, COM
SEU FILHO, CHEGAM A VILA DE TOURO E A SORTELHA,
QUE AS ENTREGAM À GUARDA DOS TEMPLÁRIOS
Há coisas onde não devemos mexer, sobretudo quando não são
nossas. Por isso, eu prefiro, também neste caso, a reprodução
deste texto e não a sua transcrição para português vernáculo,
porque entendo, que lhe retiraria a força da autencidade. E
sobretudo, quando o escritor e o copista, escreveram claro e
bem.
Repare, nesta preciosa descrição, que nos dá exactamente a
imagem, do que se passou.
Os pais só querem o bem dos filhos. D. Afonso Henriques não
quis guerras, quis simplesmente fazer valer os seus direitos de
herdeiro de seu pai.
O Conde D. Henrique, sentindo-se mal, em Astorga, com uma dor
que lhe deu e havia de lhe ser fatal, recomendou bem ao filho,
que chamou diante de si: -"Toda a Terra que eu deixo, que vai de
Astorga, até Leon e até Coimbra, não percas dela nenhutna coisa,
porque tornei-a com muito trabalho. .:"
Preste atenção à crónica: Conta a estoria em este lugar que a
linhagem dos Reis de Purtugal1 veem per esta guisa: E1-Rey Dom
Affomso tomou Tolledo aos mouros e casou hua sua ffilha que avia
nome dona Tareija (...) com huum conde que auya nome dom
Anrrique, este cassamento fez El-Rey por duas cousas a
primeira por que este conde era muy ffidalgo e de grande ssa
sangue E era primo con irmão do conde dom Regmom de Tollosa E
ueerom com elle de sua terra pelo honrrar em seu casamento /
por fazer Romaria a Santiago E a outra por que era o milhor
homem darmas per seu corpo que sse po- dia ssaber / a este conde
deu El-Rey com ssua ffilha parte de Galiza com o que era
gaanhado de Portugall e deulhe çerta terra por ssua conquista
com certas condições ssegundo nollo da a estoria ha Ja deuisado
E este conde ouue mujtas batalhas com os mouros e com os
leoneses e senpre os vençeo e(...) tomoulhes mujta terra E ouue
huum ffilho de dona Tareija que ouue nome dom Mfomso Anrriquiz e
hua ffilha que ouue nome Tareija Anrriquiz estando elle em
Estorga que era ssua enffermou de door de que morreo E a este
tenpo tijnha elle aprezada a çidade de Leom que sse a quatro
meses lhe nom acorresse o enperador que ffosse E ante que
morresse chamou antessy aquelle sseu (sic) filho Afomso Anrriquiz e disselhe filho toma esJforço no meu coraçom
- toda terra que eu leixo que he dEstorga ataa Leom E
ataa Cojnbra nom percas della nenhua cousa ca eu a tomey com
mujto trabalho. Ffilho toma esfforço no meu coraçom E ssey
ssemelhauel a myn E ssey companheiro aos ffidalgos e dá todos
seus diretos aos conçelhos ffazelhe honrra e ffaze de guisa que todos aJam direto assy os grandes como os
pequenos E por Rogo nem por cobijça nom leixes de ffazer
Justiça E porem meu ffilho ssenpre em teu coraçom ama Justiça ca
o dia que a leixares de ffazer huum palmo logo o outro dia ella
sse affastara de ty hua braça e porem meu ffilho ama a Justiça E
aueras a beençam de Deus E a graça e a benquerença das gentes e
nom conssentas aos teus homeens seer ssoberuosos e atreuudos em
mall ffazer nem ffaça fforça a nenhuum ca perderas teu boo preço
sse taaes cousas nom castigares E manda logo chamar os dEstorga
e ffazerteey que te façam menagem e logo que eu morreu vay
comjgo ffora da ujlla e logo te torna E nom ha perderas ca daquj pederas conqujstar todo o all e mandame \
ssoterrar em Bragaa que eu poborey / E despois que ouue castigado o ffilho destas cousas E ou as
mu que aquy norn dizemos morreo E logo que ffoy morto
guisou o ffilho como o ffossem ssoterrar a
Bragaa E desque todo foy guisado preguntou Dom Affomso e Arrinquiz aos seus sse hiria ao enterramento de seu
padre ou nom e elles lhe disserom que ffosse com seu
padre ca toda a terra nom auja que temer E em
quanto allo ffoy perdeo toda a terra de Leom que o
conde tijnha por sua mais norn lhe poderom tomar Galliza E despois <lhe> esto ffezerom mandou desaffiar o
enperador E entom sse foy elle para Purtugall. ca
sua madre casarasse com Dom Uermumy Perez Traua mais
despois lha tomou conde Dom Ffernando seu irmaão e casou com ella E casou Dom Uermumy Perez com hua ssua ffilha e dq
conde Dom Anrrique que auja nome Tareija Anrriquiz E
por este pecado ffoy despois fecto huum moesteiro que chamam
Sobrado/ O conde Dom Fernando era aquella ssazom o
mjlhor homem dEspanha que Rey nom ffosse E por esta Razom
alçousse toda a terra a Dom Afomso Anrriquiz com
sua madre. E elle quando esto vio forçou dous castollos
huum Nenha E outro castello da Ffeira. E danbos
estes castellos fazia elle guerra mortall a seu padrasto
entanto que ouuerom a ffazer treegoas que podessem
ffallar. E a esta ssazom era Dom Affomso chamado Ja
Prinçipe. E quando fallarom disse o conde prinçipe
nom andemos em esto vaamos huum dia a batalha ca ou nos
ssairemos de Purtugall ou uos E o principe Respondeo
çerto conde bem deuja Deus de veer tall cousa que me uos
queredes deytar da terra de meu padre que elle gaanhou aos
mouros. E ssua <madre> lhe disse mjnha he a terra
ca meu padre El-Rey Dom Affomso ma leixou. E o conde lhe
disse nom nos fez mester de pallauras ca ou leixaremos a
terra a uosso filho sse mais poder que uos e hir
nos emos em Galliza ou ,de todo ficaremos em Purtugall. E
logo aprezarom a batalha que ffosse em Guimarães em logar
que dizem Sam Rredanhas. E quando foy o dia do
prazado forom aJUntados em batalha. E quando ouuerom
dentrar em ella disse a Rainha conde com uosco quero hir
naaz E aueredes que ffazer por meu amor. E ffoy
fecta a batalha. E o principe foy arancado do cmpo e hindo
fogindo a hua legoa de Guimaraães encontrou com Dom Egas Munjz
que I vijnha em sua aJuda com elle E quando o vio assy vijr
disselhe que he esto Senhor como vijndes assy E elle disselhe
venho muy mal treito ca me aRancou do canpo meu padrasto E mjnha
madre que vijnha com elle naaz E entom lhe disse Dom Egas Munjz
Recolhede toda a gente que vem fugindo E tornemos a batalha e
prendamos uosso padrasto e uossa madre. / E entom tornarom a
batalha e vençeromna E prenderom o conde e sua madre E o conde
cujdou logo de seer morto E fezelhe preyto e menagem que nunca
entrasse em Purtugall e elle ssoltou e ffoy pera sua terra E
nunca mais entou em Purgall E o prinçipe prendeo sua madre e
metea em fferros E ella quando quando sse vyo presa disse assy
meu filho Dom Affom prendesteme em fferros e exerdasteme da
honrra que me meu padre leixou E quytasteme do meu marido E eu
Rogo a Deus que aJnda uos sseiades preso como eu soom E por que
metestes ferros em mjnhas pernas fferros quebrantem as uosas E
esto sse cnprio despois segundo uos a estoria deujsara em seu
logar. / Mais ella mandouse desto querellar ao emperador seu
~obrinho e mandouho Rogar que a tirasse de prisom E que ouuesse
todo Portugall. / E os portugueses teuerom todos com o prinçipe
e como ssouberom que sse o enperador guisaua por / vijnr em
Purtugall fforonsse todos muym bem guisados a huum lugar que
chamam Uall deUez E atenderom hi. E o enperador vijnha com muym
grande poder dAragam e de Castella e de Leom e de Galliza E
quando chegou ally o prinçipe pos lhe a batalha E ffoy uençudo o
enperador E fugio da batalha em çima de huum cauallo branco com
duas lançadas em a perna deestra E o prinçipe mautoulhe mujta
gente E prendeolhe. bij. condes E muytos caualleiros e despois
que vençeo a batalha conquistou todallas ffortallezas de
Purtugall assy como sse fossem de mouros e leuou com ssigo sua
madre presa E acabado pouco tenpo estando o enperador em Tolledo
doendosse do mall E desonrra que Reçebera do prinçipe E teendo
que toda a Espanha lhe auja de conheçer Senhorio ffalou com todos seus Ricos homeens em
grande ssegredo como queria vijnr ssobre o prinçipe. / aJuntou
grandes conpanhas E ffosse a Galiza nom dando a entender o que
queria fazer E entrou em Portugall asy de sospeita que çercou o
prinçipe em Guimaraães E a ujlla nom estava bastiçida como
conpria em tall guisa que apoucos dias a tomara o enperador
(sic) se hi esteuera. / Mais huum seu amo do prinçipe que auja
nome Egas Monjz quando o ujo em tall perijgoo ouue grande temor
de sseer ally preso. E andando o enperador huum dia em Redor da
villa catando a lagar mais fraco por onde o podesse tomar dom
Egas Muniz caualgou em çima de seu cauallo E sayo pella porta da
ujlla sao ssem ssabendo nenhuum o que elle queria fazer E
ffoisse pera o enperador e elle quando o vyo vijr foyo Reçeber E
dom Egas Monjz beyJoulhe a maão E o emperador lhe disse a que
era vijndo E dom Egas Monjz como Era bem ffallante e grande
ssabedor de guerra disselhe que lhe queria ffallar cousas de seu
serujço E despois que se apartarom a ffallar disselhe dom Egas
Monjz senhor aque veeste aqui e elle di disse (sic) que por
tomar seu ssobrinho por que lhe nom conheçia Senhorio E entom
dom Egas Monjz lhe disse Senhor uos nom ffezestes cordura de
vijr aco ca se uos alguem disse que ligeiramente poderiades
tomar esta ujlla nom uos disse uerdade que çerto sseede que ella
esta açallmada do que ha mester pera dez anos e bem ssabedes uos
que iaz hi o prinçipe vosso primo que he muy boom fidalgo com
mujtas conpanhas e muym bem guisadas pera guerra pella quall
Razom nom poderedes ffazer o que queredes e em estando aquy
poderedes Reçeber dampno dos mouros em vossa terra E quanto por
o fecto da Raynha sua madre nom o deuedes de culpar ca elle ffez
o que deuja ca ella o quisera matar e enxc;lrdar da terra que
sseu padre gaanhou aos mouros e que El-Rey dom Affom vosso auoo
e seu lhe leixou / mais quanto he do que dizedes que he Rezam de
uos conhecer senhorio e hir a uossas cortes e eu assy o tenho
que bem mais uos o nom deudes de culpar ca os seus mesteres
forom tantos que nom pode all ffazer. / Mais sse o uos qujserdes
ssegurar E alçaruos daquy e hir uos pera uossa terra Eu uos
farey que huum dia quall uos quiserdes que uaa a uossas cortes
onde uos diujsardes E desto uos ffarey menagem. / Estas
pallauras e outras mujtas lhe disse dom Egas Monjz pollo ffazer
alleuantar de ssobre a ujlla. / E o enperador lhe disse dom Egas
quero creer uosso consselho com esta condiçom que uos me
ffaçades menagem que o ffacades hir a mjnhas cortes a Tolledo e
que ffaça conheçimento quall deue E entom Egas Munjz lhe ffez
menagem assy como lhe o enperador demandou e elle ssegurou o
prinçipe e toda sua terra E pormeteo que logo em outro dia se
partisse de sobre a ujlla E logo que ouuerom fecto seu
ffallamento e ffirmado sseu preito tornousse dom Egas Monyz pera
a villa E o enperador pera ssuas tendas E desto que elles asy
fallarom à parte, soiberam muy poucos".
Obs. Este texto. apesar de ter muitos erros, para além de
interessante, tem interesse para quem goste de conhecer as
origens da nossa Língua. Pertence ao Códice n.o 99 da E.
M. E
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