SERPA

Castelo de planta poligonal, subrectangular; a
alcáçova, de planta quadrangular, implanta-se
junto à muralha N., na zona mais elevada.
Muralha vertical, reforçada por cubelos e torres
de planta quadrangular e semicircular, rematada
por merlões prismáticos, com 2 portas
monumentais flanqueadas por 2 torreões
cilíndricos chanfrados, estes com merlões de
remate pentagonal; outros vãos rasgam a muralha,
1 a E., 1 a O., 3 a S.. O pano O. é encimado por
aqueduto assente em arcada de vão redondo, entre
o Palácio dos Melos, do lado N. e uma gigantesca
nora assente num poço, junto ao ângulo SE.. A
muralha da alcáçova é reforçada pela torre de
menagem, quadrangular, adossada ao pano S., de
que resta a parte inferior, por cubelo
semicircular do mesmo lado e por torre
rectangular no ângulo SE., junto à qual é ainda
visível parte da barbacã que a envolvia. Na
praça fronteira à vizinha igreja de Santa Maria
ergue-se a imponente Torre do Relógio,
quadrangular, com remate de planta idêntica,
onde se ergue a sineira, com coruchéus de remate
cónico rodeados por merlões chanfrados.
1166 - Quando conquistada aos mouros por D.
Afonso Henriques era já povoação fortificada;
1230 - 2ª ocupação por D. Paio Peres Correia,
mestre dos Templários; Séc. 13 - é Senhor de
Serpa D. Fernando, irmão de D. Sancho II; 1295 -
Serpa recebe Foral por D. Dinis que manda
reconstruir a cortina de muralhas, aproveitando
parte das muralhas em taipa na zona da alcáçova;
1513 - Foral Novo por D. Manuel; 1555 - por
morte do Infante D. Luís, duque de Beja e Senhor
de Serpa, a Vila volta à posse da Coroa; 1641 -
por doação ao futuro D. Pedro II Serpa é
incorporada na Casa do Infantado; Séc. 17,
meados - projecto de Langres para uma fortaleza
abaluartada de reforço, apenas parcialmente
executada (forte de São Pedro, concluído em
1668); 1707 - foi sitiada pelo Duque de Ossuna,
deixando-a em grande estado de ruína; 1870 -
deram-se grandes desmoronamentos nas muralhas e
torres; 1954 - compra da parte da muralha que
pertencia à Condessa de Cuba; 2000 - em
consequência dos temporais, derrocada troço de
muralha; 2004, 14 Janeiro - abertura concurso
pela DGEMN - DREMS para obras de consolidação.
Sem mergulhar demasiado nas origens
da antiga organização administrativa do
concelho, refira-se que a documentação
escrita só nos finais do século XIII
consagra a área do termo. Assim, em 1281,
quando Serpa e todas as terras da Margem
Esquerda do Guadiana estavam ainda sob
domínio de Castela, Afonso X estabeleceu a
demarcação do concelho, para melhor se
povoar, e atribuiu-lhe o primeiro foral, o
de Sevilha.
Ao fim de um século de peripécias militares
e diplomáticas, com a Reconquista cristã do
Alentejo, Serpa recebe de D. Dinis, em 1295,
nova carta de foral.
Do ponto de vista económico, as disposições
do documento indicam que a pastorícia e a
agricultura eram as actividades
fundamentais. Quanto ao comércio, era o pão
e o vinho, os panos de lã e linho, o
pescado... e o mouro vendido em mercado.
O foral dionisino revela ainda uma sociedade
em reorganização, onde é grande a tensão
social e política. Vejam-se as penas que
oneravam as violações, o roubo de objectos e
de terras e até as dificuldades na travessia
de barco do Guadiana, de uma para a outra
margem. Mas nem só a travessia do Guadiana
era vigiada. Os caminhos também não eram
seguros e o foral pretende garantir a
protecção da actividade mercantil, em
particular a movimentação de mercadores,
judeus, cristãos ou mouros.
Outra ideia que se retira do foral de D.
Dinis é a da estrutura social vigente,
profundamente desigual. Mesmo aqueles que
tinham direitos políticos, os vizinhos do
concelho, estavam divididos pelos bens em
cavaleiros e peões. Pouco a pouco, mesmo
entre os vizinhos, começa a definir-se o
grupo mais poderoso dos homens bons e, mais
tarde, ainda nestes, os homens honrados de
boa fazenda. Na base social, sem direitos
políticos, ficavam os mesquinhos, os
mancebos, os solarengos e escravos. Os
diferentes níveis sociais não eram,
evidentemente, estanques e regista-se mesmo
uma intensa mobilidade social.
Do ponto de vista da organização
administrativa e judicial, o concelho era
dirigido por dois juizes, eleitos na
assembleia dos vizinhos, sendo depois a
eleição ratificada pelo rei. Mas uma
disposição do foral proíbe que o gentile,
ou seja, o estrangeiro ou pagão, possa
exercer o cargo.
Em 1513, Serpa recebe foral de D. Manuel
que, antes de ser rei, tinha sido senhor de
Serpa. Este foral pouco fala da organização
e da actividade política e social do
concelho. Insiste principalmente na carga
fiscal. De qualquer modo, a leitura do foral
manuelino sugere que Serpa era, no início do
século XVI, um povoado florescente onde
persistia a pastorícia como actividade de
grande relevância mas em que o artesanato e
a actividade comercial atingem um alto
desenvolvimento. Vale a pena determo-nos
sobre a actividade artesanal dos habitantes
do concelho. Fabricavam-se pelicos, mantas,
material de empreita, materiais de ferro,
ferramentas. O monarca isentava de tributo
as matérias primas usadas na actividade
artesanal. A lista de produtos
transaccionados é impressionante e se já não
há mouros da Reconquista a vender no mercado
não faltam os novos escravos, marroquinos e
do Sára e principalmente da África negra.
Serpa era, no século de D. Manuel, um dos
mais importantes portos secos do reino.
Escrevia um autor espanhol da época que de
Castela para Portugal existiam então duas
estradas principais: uma vinha de Salamanca
para Cáceres e daí para Évora e Lisboa; a
outra, partia de Sevilha e por Serpa e Beja
seguia também para Lisboa.
A propósito do foral manuelino refira-se que
em meados do século XVI o Alentejo
concentrava o maior número de centros
urbanos do país, com uma intensa actividade
artesanal e mercantil, e era, a nível
nacional, a província que mais contribuía,
com 27%, para as receitas do Estado.
Serpa apresentava-se, na centúria de
Quinhentos, como uma das mais importantes
vilas do Alentejo e do próprio reino, cujo
desenvolvimento assentava na agricultura dos
cereais e do gado mas também no artesanato
poderoso, voltado para o comércio, e numa
aliança muito estreita com o rei.
No século seguinte, Serpa quase duplica a
sua população, o que está de acordo com a
evolução geral do país. De facto, nos
séculos XVI e XVII, as terras de fronteira,
o interior, estão muito longe da
desertificação pois a fronteira não trava
ainda as ligações entre Portugal e Espanha.
Em 1674, o príncipe regente, futuro rei D.
Pedro II, confere à vila o título e os
privilégios de "Vila Notável", justificados
pelo número de moradores – mais de mil e
quinhentos -, pela nobreza das gentes,
saindo dela muitos homens insignes, tanto
nas letras como nas armas, e pela posição
militar estratégica que ocupava, junto à
linha de fronteira, em ocasiões de guerra.
Esta última situação, aliás, fez com que o
concelho fosse particularmente afectado pela
insegurança e as destruições provocadas
progressivamente pelas guerras da
Restauração de 1640/48, a guerra da Sucessão
de Espanha, entre 1703 e 1713, e as invasões
napoleónicas, em 1801 e 1814.
Em meados do século XVIII, o concelho perde
preponderância militar e, ao contrário do
resto do país, a sua população não aumenta,
talvez pelas inúmeras situações de crise
registadas devido a maus anos agrícolas.
No final da centúria de Setecentos o
concelho está mais próximo do século XVII do
que do século XIX. O antigo regime económico
mantém-se e com ele as desigualdades
sociais. As terras férteis do concelho estão
nas mãos dos grandes proprietários, que
controlam a vida municipal, e constitui-se
uma massa crescente de camponeses sujeitos a
crises cíclicas de trabalho e a uma situação
de subsistência miserável.
No dealbar do Século das Luzes, o país, em
geral, e Serpa e a sua região, em
particular, estão muito longe da "Luz" que
tanto referem os homens desse tempo.
Ironicamente, um deles, o Abade Correia da
Serra, nasceu em Serpa, em 1751.
Nos séculos seguintes ter-se-á verificado
uma concentração cada vez maior das
propriedades nas mãos dos grandes senhores,
que, salvo raras excepções, aplicam os seus
lucros fora da região.
Durante a segunda metade do século XIX, a
multiplicação dos desbravamentos, não só das
terras boas mas também das terras
improdutivas, a que chamavam galegas, e
depois, nos anos 30 e 40 do século XX, a
célebre Campanha do Trigo, que estendeu a
sua cultura mesmo às vastas regiões de
xisto, tiveram consequências desastrosas.
Desequilibraram o frágil sistema produtivo
baseado na complementaridade da pecuária com
as actividades recolectoras e com o cultivo
intenso das hortas e não resolveram o
problema de uma economia que servia os
interesses de quem vivia fora do Alentejo.
Talvez resida aqui a verdadeira dimensão do
isolamento que afecta a região.
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