Castelo de Mourão
Inventário do Património Arquitectónico
Cronologia
Séc. 13 - eventualmente primeiros
empreendimentos de edificação; 1343 -
construção, ou reconstrução da cerca e
eventualmente das portas por João Afonso; 1498 -
1541 - campanhas de restauro nas quais
intervieram Diogo e Francisco de Arruda (1517 -
1541); 1658 - cintura fortificada do sistema
Vauban por Nicolau de Langres e Pierre de
Saint-Colombe; 1950, 22 de Abril - escritura de
doação da parte urbana do prédio designado
Castelo de Mourão ao município por parte do seu
proprietário Marcos Lopes de Vasconcelos Rosado;
1977, 21 de Junho - escritura de doação, pelo
mesmo proprietário, ao município da parte
rústica do prédio designado Castelo de Mourão.
Tipologia
Arquitectura militar, gótica, renascentista,
barroca. Castelo típico da arquitectura militar
regional, com cerca quatrocentista a envolver
núcleo urbano polarizado em torno de anterior
fortificação de fundação remota mas incógnita,
como denunciam algumas torres. Cintura Vauban do
Séc. 17, de planta estrelar.
É provável que Mourão
se inclua na lista das povoações conquistadas
aos árabes entre os anos de 1165 e 1166, quando
as tropas cristãs se lançaram na conquista de
Moura, Serpa e Alconchel. A alusão àquela
localidade aparece no reinado de D. Sancho II,
quando D. Gonçalo Egas, prior da Ordem do
Hospital, lhe concede o seu primeiro foral em
1226, fomentando deste modo o repovoamento de
Mourão.
Relativamente à titularidade
desta localidade, esta apresenta-se como um
elemento que se integra na indefinição de
fronteiras entre os vários reinos resultantes da
reconquista cristã, ora pertencendo ao reis de
Castela e Leão ora sob o domínio do reino de
Portugal.
Em virtude do seu acidente em
Badajoz, D. Afonso Henriques teve que ceder
muitas das suas praças conquistadas ao rei de
Leão e Castela, sendo muitas integradas na coroa
portuguesa no reinado de D. Afonso III. Este
cede a vila de Mourão a D. Afonso X de Castela
(1264) e, em 1271, este rei troca a vila de
Mourão com os freires do Hospital, sendo estes,
possivelmente, os construtores do primeiro
castelo, apesar de não existirem provas cabais
sobre esta matéria.
Em 1295 a vila de Mourão é
doada a D. Beatriz, viúva de D. Afonso III de
Portugal. Após a morte de Afonso X de Castela,
D. Sancho IV contesta a doação e concede a vila
à sua “barregã”, D. Teresa Gil. Mourão retorna
para a posse portuguesa, quando D. Sancho IV de
Castela renuncia à margem esquerda do Guadiana,
na sequência do auxílio que lhe prestou D.
Dinis. Este, a 27 de Janeiro de 1296, concede o
primeiro foral conhecido a Mourão e reconhece,
de jure, no encontro de Salamanca (1298), D.
Teresa Gil como senhora da localidade, passando
Mourão para a coroa portuguesa após a sua morte.
Após a exéquias de D. Teresa
Gil, o rei português irá conceder a um fidalgo
espanhol, D. Raimundo de Cardona, o privilégio
de poder comprar Mourão, facto que se irá
consumar em 1313, contraindo para tal um
empréstimo de avultada quantia a um judeu. Dada
a impossibilidade de cumprir honradamente os
compromissos assumidos, a praça de Mourão será
novamente sujeita a leilão, em 19 de Abril de
1317, no alpendre da Igreja de Nossa Senhora do
Tojal, sendo desta vez adquirida por um mercador
de Monsaraz, de seu nome Martim Silvestre, por
11 000 libras. No entanto, dadas as
incompatibilidades sociais entre o mercador e o
rei, este vai exigir a sua devolução pelo mesmo
preço de aquisição, fazendo nova concessão a D.
Raimundo e a seu filho Guilherme de Cardona.
Decerto neste período
procede-se ao incremento de povoamento desta
área fronteiriça como ocorria pelo país fora,
através de incentivos à fixação de gentes, de
modo a contribuir para a defesa da zona raiana e
para a estabilização da fronteira nacional. Os
coutos de homiziados são um dos exemplos dessa
política de fixação. Povoações próximas de
Mourão, como Noudar (1308), por carta de D.
Dinis, e Monsaraz (1414), no reinado de D. João
I, foram coutos de homiziados, reflectindo a
política do reino em assegurar o povoamento de
muitas povoações da raia que os surtos de peste
e, mais tarde, a crise da independência
arruinaram.
Relativamente à crise de
1383-85, o Alentejo foi palco de episódios
violentos, resultado das fortes tensões sociais,
que a sucessão de D. Fernando potencializou
conferindo às clivagens existentes no país uma
conotação política. Fernão Lopes relata-nos
algumas actuações do povo no Alentejo visando os
que tomavam voz por D. Beatriz, como o sucedido
em Beja e em Évora, em que, num clima de grande
agitação e emoção são assasinados o almirante
Lançarote e a abadessa.
Neste período conturbado a
praça de Mourão aderiu à causa do Mestre de Avis
como é referido na crónica de Fernão Lopes.
Os constantes recontros
militares com vista à manutenção da
independência nas zonas fronteiriças do Alentejo
contribuíram para a diminuição da população
nessas áreas, já anteriormente afectadas pela
peste negra. É neste quadro que se entende o
pedido a D. Afonso V, em 1450, por parte dos
homens bons do concelho de Mourão para que este
fosse um couto para 50 homiziados (Cosme, 1988:
6).
Para além da guerra da
independência, as populações fronteiriças da
Beira, mas em particular as do Alentejo foram
fortemente afectadas entre 1475 e 1478, quando
foram alvo de devastadoras incursões
castelhanas, na sequência da sucessão de
Castela, na qual D. Afonso V se intrometeu para
defender os interesses de sua sobrinha D. Joana,
a Beltraneja. Mourão foi uma das muitas
localidades alentejanas atingidas pelas tropas
castelhanas (Moreno, 1983: 129).
Assim, em virtude dos
condicionalismos ditados pelas estratégias
geo-políticas dos monarcas portugueses, o
povoamento da vila de Mourão conheceu períodos
de expansão e contracção demográfica.
Um desses períodos de
evolução demográfica positiva registou-se no
século XVI, quando nos censos ordenados por D.
João III (1527), em Mourão, 305 fogos foram
contabilizados dando uma totalidade de 1373
habitantes (305 fogos x 4,5 pessoas por fogo).
De referir que esta tendência também é
atribuível às restantes freguesias constituintes
do concelho. Aquando da visita de D. Sebastião
ao Alentejo e ao Algarve em Janeiro/Fevereiro de
1573, com o objectivo de aquilatar a capacidade
das localidades em dotar homens disponíveis para
a sustentação da sua política militar no Norte
de África, Mourão contribuiu com duas bandeiras,
ou seja, com 400 homens (Loureiro, 1983: 543).
Para o crescimento
demográfico de Mourão deve-se ter em conta a
fixação de judeus nesta localdade, sobretudo a
partir de D. AfonsoV.
“ A minoria judaica viveu em Portugal como um
corpo dentro de outro corpo”. É assim que Maria
José Ferro Tavares sintetiza a situação dos
judeus em Portugal. Em Mourão, segundo a autora,
havia uma comuna de judeus, termo que engloba o
arruamento onde eles habitavam (judiaria) e as
autoridades que a regiam.
Ligados às actividades
mercantis e artesanais bem como à prática da
usura, os judeus são referidos por altura da
compra de Mourão, quando se tornam credores
tanto do nobre D. Raimundo de Cardona, na pessoa
de D. Judas, arrabi-mor de D. Dinis, como do
mercador Martim Silvestre, que apresenta como
seu credor o arrabi-mor Guedelha.
O crescimento da população
judaica em Mourão, em 1500, é patenteado na
pensão de doze mil reais que Diogo de Mendonça,
alcaide-mor, recebia pelo desempenho do cargo de
anadel-mor da judiaria da vila. Não se sabe ao
certo onde é que esta se situava, se dentro ou
fora da povoação. O Dr. João dos Santos Cosme
coloca a hipótese da judiaria se situar no local
conhecido por Maquedas, a aproximadamente 2 Km
da fronteira de S. Leonardo (Cosme, 1988: 6).
A tendência crescente da
população de Mourão é confirmada em 1757 quando
apresenta um saldo contabilístico de 450 fogos,
somando 950 fogos em conjunto com as 3
freguesias do concelho (Leal, 1875; 573).
No que diz respeito à
alcaidaria de Mourão, esta foi atribuída pelo
futuro rei D. João II a Diogo de Mendonça,
estando nesta família até ao reinado de D.
Afonso VI. Aquando da instauração da monarquia
dualista (1580), Mourão, através do seu
alcaide-mor Francisco de Mendonça, aderiu à
causa espanhola, tendo passado, após 60 anos, na
pessoa de Pedro de Mendonça Furtado, para o lado
dos conspiradores. O herdeiro da alcaidaria de
Mourão, amigo íntimo do Duque de Bragança,
sentiu a necessidade de dignificar a imagem da
sua família, sendo dos primeiros conjurados a
tomar parte nos acontecimentos que conduziram ao
1º de Dezembro de 1640.
Após a Restauração, no âmbito
das guerras da independência, Mourão sofreu o
impacto das frequentes escaramuças fronteiriças,
sendo a sua praça assolada pelo exército inimigo
em diversas ocasiões, sendo de realçar o cerco
da mesma pelo exército do Duque de S. German, em
que, sob o comando do Capitão João Ferreira da
Cunha, a praça conseguiu resistir apenas durante
6 dias, revelando desse modo a fraqueza das
muralhas do castelo. ”A população achou inútil
insistir na resistência, de que só resultaria a
destruição da vila e do castelo, e por isso este
içou a bandeira branca” (Almeida, 1991:168).
Dado que a reconquista de
Mourão se tornou numa prioridade fronteiriça, a
rainha regente, D. Luísa de Gusmão, empenhou-se
profundamente na tomada da vila aos espanhóis,
acontecendo esta a 29 de Outubro de 1657. Nessa
reconquista teve um papel determinante Joane
Mendes de Vasconcelos, homem afastado de
partidos e das intrigas da corte, sendo por isso
nomeado pela rainha para o comando das tropas no
Alentejo (Almeida, 1991:168).
O alcaide-mor de Mourão,
Francisco Mendonça Furtado,cavaleiro que tinha
como incumbência o governo do castelo e da
região, aquando das desavenças entre D. Afonso
VI e seu irmão, o Príncipe D. Pedro, tomou
partido pelo rei deposto, e por isso foi
obrigado a exilar-se para Castela, sendo
condenado à morte à revelia. Assim, a
alcaidaria-mor de Mourão passou posteriormente
para o 2º Marquês de Montebelo, António Félix
Machado da Silva e Castro.
No século XVIII, Mourão
sofreu os efeitos do terramoto de 1755, o que,
conjuntamente com os trabalhos de arranjo,
ampliação e consolidação da estrutura defensiva
do castelo, iniciados no século XVII, e o estado
de destruição que as sucessivas investidas dos
inimigos provocaram no casario, levou ao
redesenhar da traça urbanística da actual vila.
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